O remoer de uma angustia

Caros, permitam-me dividir com vocês o remoer de uma angustia.

Desde o conveniente fechamento da nossa fronteira agrícola o debate sobre agricultura e meio ambiente no Brasil tem se pautado sobre a evidência de que a pecuária pode liberar terras para todos os outros usos pensáveis. O argumento não é errado, mas é ligeiro.

Nem toda a área ocupada por pecuária hoje no Brasil tem aptidão agrícola, florestal, ambiental, ou social. Nem toda área ocupada por pecuária hoje no Brasil pode ter seus índices de produtividade elevados aos píncaros como se supõe rápida e rasteiramente, sobretudo porque cana, grãos e florestas comerciais, sorvem por primeiro as melhores áreas.Logo, a capacidade real de amontoarmos nosso gado para cedermos área a outros usos, por assim dizer, mais nobres, é muito menor do que se supõe.

Não estou aqui advogando pelo status quo. A intensificação da pecuária nem é um fenômeno inventado pela conveniência da restrição espacial. Antes, é um processo que caminha inexorável desde os primeiros anos do século XVII quando os primeiros mugidos foram ouvidos em nossas terras.

Aliás, digo de passagem, nem sempre (r)evoluções tecnológicas na pecuária resultaram em economia de espaço. Lembrem o que aconteceu com a introdução do Zebu, no final do século XIX, e da Brachiaria, no final do século XX.Por dever de ofício, tenho circulado nos últimos meses nos salões do poder Legislativo. Por aqui tenho visto um e outro defensor do “setor rural”, assim mesmo, lato sensu. Mas um olhar mais cuidadoso revela uma desproporção importante nessa representação. A maioria dos defensores do setor rural é gente ligada ao elos além porteira do agronegócio.

Sabemos todos que o interesse da indústria nem sempre corre alinhado com o interesse do produtor. Na cadeia da pecuária isso é ainda mais crítico.

Digo isso remoendo a tal angústia. Nossa pecuária talvez esteja diante do seu maior desafio, mas encontra-se completamente desarticulada e sem voz para enfrenta-lo.
O Paulo Barreto, do Imazon, tem propostas para a pecuária. O Roberto Smeraldi, da Amigos da Terra, tem propostas para a pecuária. O Greenpeace por meio do JBS tem propostas para a pecuária. O Ministério Público tem propsotas para a pecuária. O Ministério do Meio Ambiente tem propostas para a pecuária. Mas, qual é a proposta da pecuária para a pecuária? Quem falará por nós, meus caros?

Foto: Alina Souza/Palácio Piratini

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