Na sorrateira: como a crise dos anos 90 entregou às ONGs a nossa soberania territorial

É por completo acaso que se descobrem as coisas mais interessantes.

Cá estou fazendo minhas pesquisas na internet quando caio na página do WWF e encontro o texto abaixo. Tem a foto do nosso ex-Presidente, então vou checar. Leio e sinto cheiro de fumaça. O que encontro é um verdadeiro vulcão.

Vejam abaixo.


O WWF se gaba por ter conseguido convencer os mais diversos países a implementarem políticas preservacionistas. No caso do Brasil, eles nos contam que, no ano de 1998, conseguiram convencer o Presidente a se comprometer a comprometer 10% do nosso território com a preservação ambiental. E, para que o recado chegue diretamente a quem interessa, o WWF faz questão de lembrar que só esses 10% já são mais do que todos os parques nacionais dos EUA continentais.

Refrescando a memória

A economia do Brasil esteve na corda bamba durante mais de 20 anos a partir do começo dos anos 80, e possivelmente 1998 foi o ano mais crítico. Depois da crise dos tigres asiáticos, em 1997, o Brasil era visto como a bola da vez, e o Presidente não queria deixar a bomba estourar em 1998, pois haveria eleições. Da mesma forma, o Banco Mundial e o FMI queriam que FHC continuasse no poder pois isso garantiria a continuidade da política econômica ortodoxa.

Em 1998, portanto, a situação era absolutamente crítica. O país sofria pressão de todos os lados, e o Presidente precisava segurar as pontas pelo menos até novembro. É claro que o ambientalismo internacional se aproveitou da situação.

Tudo bem, até aqui todo mundo já está cansado de saber. O que anda apagado da memória de muitos - apesar de ser público e motivo de orgulho para alguns - é que em Abril de 1998 Fernando Henrique se comprometeu com o Banco Mundial a criar - segundo informação do próprio Banco - 25 milhões de hectares de áreas protegidas no Brasil até o ano 2000 (que não são 10% do território, e sim em torno de 3%; do que se conclui: ou o WWF mente - duvidoooo!!! - ou o Banco Mundial mente. Em qualquer caso, trata-se de mais terra do que o que tem gerado briga, mortes e pobreza nos últimos meses devido à FUNAI / questão indígena).

Coincidentemente, naquele mesmo ano - segundo informações do próprio Governo - o Brasil conseguiu US$ 41,5 bilhões de empréstimo com o Banco Mundial, o BID e o BIS!

Não fica pouca suspeita, portanto, de que o WWF pode ter costurado nos bastidores um acordo do tipo toma-lá-dá-cá.

A história a partir daí é conhecida de todos os que nos preocupamos com a soberania territorial e com o homem do campo. Foi exatamente no segundo governo FHC que se implantou a máquina de criação de áreas protegidas e de esbulho do agricultor que hoje está instalada. Foi o período em que se sedimentou a guerra - que nunca devia ter existido - entre preservação ambiental e desenvolvimento econômico.

Revendo e repensando

Ainda que a "descoberta" deste post não seja assim tão reveladora, pois o acordo entre FHC e WWF / Banco Mundial foi cantado aos quatro ventos, o atual é um bom momento para reavaliarmos o papel das forças externas na definição daquilo que temos de mais básico e estruturante para o país - a demarcação do território.

Eu não pretendo ter uma visão maniqueista do assunto. É claro que reconheço que os avanços no Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), a redução do desmatamento, o aumento das Áreas de Preservação Permanentes, etc, são resultados positivos que de alguma forma estiveram relacionados com a pressão feita por ambientalistas. Só que também admito que fomos longe demais na repressão, que fizemos uso de estratégias completamente contraproducentes, e que estamos impondo custos pesadíssimos ao produtor brasileiro para salvar o pelos da indústria dos países desenvolvidos.

Estamos passando por um momento saudável de democracia: discutimos a fundo a questão indígena, com o que este blog está colaborando bastante; começamos a questionar as decisões que caem de Brasília como meteoros; e também precisaremos entender quais são e quais foram as forças políticas que influenciaram e continuam influenciando a forma como gerimos o nosso espaço. Talvez com isso consigamos chegar a fórmulas melhores para potencializarmos o desenvolvimento do nosso país com base nos recursos humanos e naturais de que dispomos.

Comentários

Eduardo disse…
Petterson, entendo que os fatos mostram claramente a relação Áreas protegidas/acesso à fundos internacionais, mas eu duvido que os "ambientalistas" tenham tanto poder assim. Me parece claramente que essa foi uma contrapartida a qual FHC e sua equipe avaliaram que seria uma moeda de troca melhor ante outras possibilidades e assim acessaram os recursos. Eu te pergunto, agora com o atual governo privilegiando o Agro, você acha que essa diretriz mudou?
Oi Eduardo,

muito obrigado pelo seu comentário.

É claro que a evidência que eu coloquei não prova nada. Trata-se apenas de uma corrrelação temporal. Mas eu tendo a achar que o ambientalismo internacional tinha todo esse poder nos anos 1990. Na verdade, continua tendo; o que mudou foi o poder de barganha do Brasil.

Em 1998 nós estávamos verdadeiramente na corda bamba. Imagine que você, sei lá, tenha aplicado as economias de toda a sua vida na empresa do Eike Batista, tenha insistido em manter as ações pensando que tratava-se de uma crise passageira, e agora começa a achar que você realmente vai ficar a ver navios (literalmente!!). Você é uma pessoa que está na corda bamba. Você está por perder tudo o que tem. Daí vem um cara dizendo que compra as suas ações ao preço de 4 meses atrás bastando que para isso você se torne um ambientalista desgovernado!

Eu vejo que a situação era essa. E não sei se teria tido como o governo dar resposta diferente, mas o fato é que desde a Rio-92 o ambientalismo ganhou espaço político no mundo de forma galopante.

Será que o governo atualmente privilegia o agro? Eu não seria tão categórico, mas acho que, realmente, o agro tem bem mais espaço político hoje do que há 5 anos. Há duas novidades hoje: 1. o país não está na corda bamba; 2. o país está encaminhado para estar novamente na corda bamba daqui a alguns anos, e o agro é a única perspectiva realista de postergar esse cenário.

Dadas essas duas realidades, a sociedade está cada vez mais entendendo que talvez o negócio seja investir no agro, e que não precisa mais se submeter ao joguinho das ONGs internacionais.

Saudações,
Luiz Prado disse…
A análise é verdadeira, ainda que - a meu ver - incompleta.

A política norte-americana de imposições sobre a Amazônia começou bem antes, ainda à época do Bush-pai, que por sugestão de William Reilly, ex-presidente do WWF-US e então administrador da EPA, condicionou a sua vinda à Rio-92 ao compromisso público de Collor de "preservar a Amazônia".

De fato, Reilly teve um encontro com o príncipe Charles em seu iata que estava no rio Amazonas - com Lady Di e tudo, mas com Wolfenson, presidente do Banco Mundial também - e Collor pousou no iate de helicóptero, e lá bateram o martelo sobre a tal proteção. Só então, comunicado do anúncio público do compromisso brasileiro que seria feito na Rio-92, Bush confirmou a sua vinda (o medo era de que se ele não viesse os demais chefes de estado dos países que dão as cartas tampouco viessem e a conferência fosse um fracasso).

A política, aí, jogou e continua jogando bem mais do que a economia. Para os americanos adiarem indefinidamente qualquer compromisso com a redução das emissões de carbono - eles continuam sendo, de longe, os maiores emissores PER CAPITA do mundo (fora os países árabes, por razões óbvias) era preciso ter um pretexto - para fins de política interna TAMBÉM - e o pretexto era exatamente o papel da Amazônia nas mudanças climáticas (totalmente fake, mas muito útil aos países que mais usam petróleo).

O WWF-US é um típico caso de um rabo que balança o cachorro. Nada em dinheiro e faz o que o governo norte-americano quer. Mantem, inclusive, um WWW na Suíça para "lavar dinheiro", isto é, fazer remessas para outros WWFs que não se sustentam.

E vamos por aí afora.

No Brasil, jogou essa cartada do Programa de Áreas Protegidas da Amazônia - conhecido por eles pela sigla ARPA. Mas o governo não viu um tostão. O dinheiro foi direto para a conta de uma ONG que estava mortinha, conhecida como FUNBIO, e foi usada para recebê-lo. O presidente do Conselho de Administração da ONG era o sócio da Natura, depois candidato a vice de Marina Silva. Como todo mundo sabe, a Natura queria mais Reservas Extrativistas para assegurar as suas linhas de suprimento de matéria prima barata para os seus produtos da linha Ekos. Depois, a linha Ekos não pegou no exterior e eles pararam com o frenesi de RESEX.

E vai por aí afora.
Luiz Prado disse…
PS - O FHC foi só um otário nisso tudo. O "príncipe" gosta de ler o Le Monde e achou que aumentar por MP a reserva legal na Amazônia daria uma resposta às notícias que ocorreram com a divulgação das primeiras análises baseadas em imagens de satélites. A vaidade supérflua prevaleceu sobre o bom senso.

Já Marina, é óbvio, não sabe nada, é uma invenção no vácuo de Chico Mendes e da tolice dos "povos da floresta", e entrou na canoa porque o seu mundo mental se limitava a Xapuri.
Muito interessante, Luiz!

É incrível como no meio acadêmico brasileiro este tipo de reflexão é inexistente. O Brasil urbano comprou só a versão radical do ambientalismo gringo. Ficou de fora a análise da política do ambientalismo global - coisa que fora do Brasil é feita normalmente nos meios acadêmicos, da mesma forma que em economia estudamos os aspectos políticos que estão por trás de cada decisão ou idéia.
Luiz Prado disse…
E eu continuo me perguntando qual foi a destinação de alguns bilhões de reais oriundos de compensações ambientais a partir da aprovação da Lei do SNUC, assunto que vem despertando a atenção do MPRJ, como se pode ver em http://issuu.com/mp_araruama. Esse tio de dinheiro deveria ter sido suficiente para das às unidades de conservação brasileiras - pelo menos a algumas delas - características equivalentes àquelas dos parques nacionais norte-americanos e canadenses, com um pouco de boa gestão e clara definição de metas.
Eduardo disse…
Interessante que em Minas, tb sob governo PSDB, a legislação ambiental por lá é mais restritiva que a Federal em vários fatores..