Pequenos produtores paulistas: fiquem atentos. Aqueçam os
motores porque vai ser preciso colocar os tratores na rua outra vez. O governo
estadual e sua Companhia Ambiental (CETESB) acabam de fazer uma releitura do
Código Florestal que risca da Lei os benefícios que vocês adquiriram.
A Procuradoria Geral do Estado de São Paulo enviou um e-mail
instruindo a CETESB a rasgar o Código Florestal. É o que se vê em ofício da
CETESB que nos foi encaminhado por um leitor. O documento, datado de 19/06,
estabelece, com base no e-mail encaminhado pela Procuradoria, o procedimento
técnico para licenciamento de reserva legal do homem do campo paulista.
O Código Florestal aprovado no ano passado instituiu
como Áreas Consolidadas aquelas que haviam sido desmatadas antes de 22/07/2008.
Neste caso, para fins de reserva legal, e quando se trata de propriedades com
mais de 4 módulos fiscais, a autoridade ambiental deve elaborar um Plano de
Regularização Ambiental (PRA) para que o produtor faça a recomposição. O que alguns chamam de “anistia” é apenas o fato de que a autoridade já não pode
multar o produtor por ter feito desmatamento em área consolidada. A recuperação
continua tendo que ser feita, como antes.
Pois bem. A maior salvaguarda que o setor produtivo do campo
conquistou com toda a batalha que encampou durante anos no Legislativo Federal
e em muitos outros âmbitos é a que vem a seguir, e é ela mesma que a CETESB
está rasgando. As propriedades que naquela data (22/07/2008) tinham área
inferior a 4 módulos fiscais – ou seja, pequenas propriedades –, segundo o Artigo 67 do Código, ficam
isentas dessa recuperação de reserva legal. O pequeno produtor, de condição econômica mais frágil, não precisará abrir mão de área produtiva.
O texto do artigo 67 diz que a reserva legal das
propriedades com menos de 4 módulos fiscais fica sendo igual à área que, em
22/07/2008, estava ocupada com remanescentes de vegetação nativa. Portanto, se
o produtor tinha apenas 2 metros quadrados de vegetação remanescente, isso
passa a ser a sua reserva legal, sem obrigação de qualquer recomposição
adicional.
É uma incomensurável vantagem para quem realmente
vive da terra, que simplesmente não pode renunciar a 10%, 15% ou 20% de sua área
agriculturável. Uma carta branca para o pequeno tocar a sua vida sem ser
incomodado pelo ambientalismo cabeça oca.
Mas é claro que os ambientalistas do governo do estado de SP
não poderiam tolerar isso. Decidiram, então, recorrer ao velho malabarismo
jurídico / semântico para manter pelo menos um pouquinho do osso. Alguém lá em Pinheiros
perguntou: “peraí, o que acontece quando o cara não tinha nada, zerinho, nem
sequer meio metro quadrado, de área remanescente? Nesse caso, não tem como ele
ter uma reserva legal segundo o Artigo 67, certo?”.
Certo!
Alguém na Vila Madalena imediatamente respondeu: “bingo.”
Como assim?
Um outro Artigo do Código, de número 12, diz que “TODO imóvel rural deverá
manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de reserva leval (...)”.
Com isso, não ter uma reserva legal vai contra a lei. Se o pequeno produtor
não tem sequer meio metro quadrado de vegetação remanescente, segundo a semântica
jurídica da CETESB, ele não tem reserva legal, portanto está ilegal.
Mas a
CETESB entrará dando uma “ajudinha” para que o produtor fique regularizado..
Para dar essa força ao coitado que teve a má sorte de não ter
nenhum remanescente de vegetação nativa ou em regeneração, o ofício da CETESB instrui o pessoal
técnico a exigir a recomposição de 20% da área total da propriedade!!!
Então fica assim: o pequeno produtor que tinha meio metro
quadrado de área remanescente não precisa recompor; já aquele que não tinha
nada, tem de recompor 20% da propriedade. Rasga-se a salvaguarda que a
sociedade deu aos pequenos produtores.
Mas não é só isso
Para engrossar o ferro, o e-mail do Procurador recorreu aoDecreto Federal 7.830 para lembrar que ainda que você, pequeno produtor, tenha um pedaço de vegetação
que já estava em recomposição fazia um bom tempo, mas que o técnico da CETESB
não considera “vegetação primária ou vegetação secundária em estágio
avançado de regeneração”, isso não é remanescente, e você terá de recuperar
os 20%. A área de remanescente de vegetação nativa não pode estar em estágio
intermediário ou inicial de regeneração.
Depois disso, aquele cara disse “bingo” umas mil vezes..
Resumo da ópera:
-- A CETESB e a Procuradoria do Estado de SP fizeram uma
interpretação extremamente tendenciosa, porém possível, do Artigo 67 do Código
-- A intenção do legislador era poupar o pequeno produtor de
ter que recompor, mas a releitura do governo paulista rasga esse benefício
-- O resultado é uma situação inusitada em que quem manteve
qualquer cantinho de vegetação remanescente pode ficar como está, mas quem não
tinha nem um cantinho é obrigado a recompor na mesma medida que os grandes e
médios produtores
--
E se esta interpretação do governo de SP pega em outros
estados? E se isso vai para a Amazônia, onde o pequeno teria de recompor não
20%, mas 80% de sua propriedade? Temos de ficar muito atentos a esta movimentação. O
ambientalismo não tem freio quando se trata de sobrepor a natureza ao homem.
Seria
interessante saber como está se dando a implementação desta diretriz. Algum dos
leitores já foi afetado? Se puderem, mandem-nos os seus relatos para que publiquemos
aqui.
Comentários
Como no art. 67, o legislador deu a 'brecha' para aqueles pequenos produtores que deixaram ao menos 1 m² com remanescente de vegetação em sua propriedade a computarem essa área como sua Reserva Legal. Porém, não diz, em nenhum momento, que aqueles que não preservaram estará isento da sua recomposição.
No Sudoeste Paulista, os cartórios tem exigido a inscrição no CAR para não exigir a averbação da RL a margem da matricula do imovel, todavia, o CAR paulista ainda não está em funcionamento. a SMA disse que o pleno funcionamento deste, depende de ato do MMA.
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