A reserva legal deu resultados?


Começo hoje uma seqüência de posts em que tentarei determinar o quanto a reserva legal reduz o desmatamento. Por incrível que possa parecer, praticamente não há pesquisa científica sobre este assunto. Depois de mais de quinze anos de debates sobre o código florestal, os únicos trabalhos acadêmicos que passaram perto de apontar os resultados da reserva legal sobre a redução do desmatamento foram três: Oliveira e Bacha (2003), Bacha (2005), e IPEA (2011). 


Será que a reserva legal reduz mesmo o desmatamento?
O estudo do IPEA é o de menor interesse, dadas as importantes deficiências elencadas aqui por André Nassar. Já os outros dois artigos deram um primeiro importante passo, mas ainda nos deixam muito longe de ter idéia dos resultados efetivos que teve a reserva.


Não é difícil analisar esse assunto. Ao jogar insegurança jurídica nos produtores rurais com a farra das Medidas Provisórias dos anos 1996-2001 (67 reedições, pelo menos 6 delas com alterações substanciais de conteúdo), o governo deu aos acadêmicos a possibilidade de estudar como aumentos ou reduções no percentual exigido de reserva legal impactam o desmatamento. Se a reserva legal tivesse ficado sempre a mesma, não seria possível estimar o impacto dela sobre o desmatamento.


Para se ter uma idéia da magnitude das alterações, a tabela abaixo mostra a exigibilidade de reserva legal para uma categoria de produtores rurais do estado de Rondônia em diferentes pontos no tempo. A última coluna da direita indica que em 1996 os produtores da sub-zona 1.1 de Rondônia com propriedades de menos de 100 ha (a grande maioria) que tinham 50% de reserva legal estavam em dia com o código florestal; já em 1997, com o aumento da exigência de 50% para 80%, esses produtores passaram a ter um déficit de 30%; se tivessem se adaptado, em 1998 teriam ficado com um superávit de 80%, pois ganharam o direito de desmatar 100%; que foi perdido em 2000; etc.



Tabela 1. Desmatamento permitido e déficit de reserva legal de acordo com as diferentes legislações



É claro que essas modificações não foram feitas porque se acreditava que reduziriam desmatamento. Como bem argumentou o Ciro (Ciro e Nogueira, 2004), a farra das MPs foi bem mais uma forma de o governo deslocar a atenção de outros temas para poder agir com mais liberdade do que a evolução de uma visão sobre como conter o desmatamento. Ainda assim, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e a Academia Brasileira de Ciências argumentaram que o código vigente até 2012 era muito bom e que alterá-lo iria aumentar desmatamento. Eles só poderiam estar certos se a reserva legal tivesse o efeito de reduzir o desmatamento.


É o que veremos.


No próximo post visualizaremos no mapa as principais alterações do código florestal. Até lá.

Comentários

manoel luis disse…
Caro dr. Ciro e agora demais colaboradores: parabéns pela nova linha editorial do blog, pois ampliou-o e tecnificou-o sobremaneira, em especial porque abriu espaço para técnicos articulistas que tanto têm enriquecido o tema.
O blog entrou efetivamente em nova e produtiva fase e tenho certeza estará ampliando muito a permanência dos que já o conhecem e acompanham como outros que se somarão pela seriedade como o tema é tratado.
Que Deus continue dando Sua Luz para tema tão importante ao nosso país.
Att. Manoel Neto
Tailor disse…
Vamos lá , estou curioso com a continuação deste assunto, principalmente porque , esta sendo divulgado por alguém que se aprofundou no assunto de forma cientifica , sem paixões ou tendências.
Vamos lá estou aguardando ansioso.
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Parabéns ao Ciro , conseguiu passar o bastão para uma equipe com conteúdo.
Braso disse…
Os..novos..comentaristas..comentando..pela..logica.. acadêmica..é..positiva..para..os.. acadêmicos,..nos..os..leigos..que..produzimos..alimentos..na..raca,.. precisamos..de..uma..linguagem..simples..para..entendermos.
Maria Lucia disse…
Uma dúvida: as recentes alteraçõeos no CF estabelecem que a reserva legal não precisa mais ser averbada em Cartório. Porém, estou sendo desapropriada porque a minha área de RL não estava averbada à época da vistoria. Em sendo assim, o INCRA jogou a área de RL no cálculo da área utilizável, e óbvio, de um GUT abaixo doso 80% o que gerou para eles uma "grande propriedade improdutiva", apesar do próprio engenheiro vistor do INCRA escrever no laudo que a área existia, mas não estava averbada. Pergunto, já que o meu processo ainda está em andamento, será que posso me beneficiar desse novo entendimento?
Agradeço, desde já, a sua resposta.