Cadáver ignorado revela sociedade paralela de milhares de invisíveis na Amazônia


Sob as copas das árvores amazônicas, alvo de debates e preocupação mundial, uma multidão de brasileiros invisíveis vive à margem da sociedade sem sinais de comoção ou indignação internacional. Os membros desta sociedade paralela são invisíveis ao Estado e não aparecem em qualquer estatística oficial porque lhes falta o básico: uma certidão de nascimento.

A região Norte, onde ficam os principais Estados amazônicos, tem a maior concentração do país de pessoas sem documentos, segundo o Ibge. Lá, 9 de cada 100 pessoas não têm documentos e não são consideradas cidadãs. Apesar de os números absolutos serem maiores pela maior concentração de pessoas, o percentual de brasileiros não identificados no sudeste é muito menor — ou 1 a cada 100 pessoas.

Não à toa, também estão no Norte do país os mais baixos índices de desenvolvimento humano do Brasil. "O que temos aqui no Norte é a correlação umbilical entre pobreza e subregistro", disse a Defensora Pública Geral do Pará, Jeniffer de Barros Rodrigues à BBC News Brasil.

"Quase 6 milhões de pessoas ganham até 3 salários mínimos no Pará. E mais da metade delas está abaixo da linha da pobreza", diz ela. A trajetória de privações e derrotas de Adriano Lima Ferreira, um rapaz alto e forte, de cabelo escuro e traços que misturam características indígenas e afro-brasileiras, ilustra o desafio encarado pelos brasileiros invisíveis na Amazônia.

O primeiro documento de Adriano foi sua certidão de óbito.

Já a primeira menção oficial à sua existência aconteceu enquanto ele ocupava uma câmara gelada do Instituto Médico Legal de Belém. Para o Estado brasileiro, naquele momento, o nome de Adriano, nascido no interior do Pará e morto aos 26 anos na periferia da capital, era "Cadáver Ignorado Protocolo 2019.01.050549".

Nascido em uma enfermaria de Abaetetuba, onde 65% das pessoas vivem abaixo da linha da pobreza, segundo o Ministério Público, Adriano não foi registrado pelos pais, que se separaram na época de seu nascimento.

Ele escapou da alta taxa de mortalidade infantil na região — 20 a cada 1.000 nascidos, ou o dobro do aceitável segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) — e chegou à idade escolar.

Foi quando ganhou um apelido bastante comum nas cidades ribeirinhas da Amazônia, e absolutamente desconhecido entre a classe média do Sudeste do país: Adriano, então um garoto magro e agitado, passou a ser conhecido como "encostado".

Veja matéria na íntegra no site da BBC Brasil

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