Construindo Pontes II: Ambientalista da ONG ISA reconhece falhas no Código Florestal

Caros, segue abaixo dois trechos de entrevista concedida pelo ambientalista Raul do Valle do Instituto Socioambiental (ISA) ao portal IHU. Reparem que o ambientalista do ISA reconhece ponto importantes. Antes da celeuma provocado pelo Relatório de Aldo Rebelo seria impensável ouvir um ambientalistas dizendo coisas como as que vão abaixo sobre o Código Florestal.

Segue abaixo alguns trechos da entrevista em azul e meus comentário em vermelho:

IHU On-Line – A maioria das áreas de preservação no Brasil pertence a particulares ou à união. Qual a atual situação de preservação das matas em terras particulares?


Raul Silva Telles do Valle – Grande parte das terras no país pertence a particulares e, portanto, naturalmente grande parte das matas está em mãos particulares. Estima-se que cerca de 80% do que restou de mata atlântica esteja em imóveis particulares. Mas, em função de um histórico de desrespeito à lei, que nunca teve instrumentos eficientes para ser aplicada, hoje boa parte dos imóveis particulares tem algum déficit de vegetação nativa, ou seja, está irregular. Não há dados precisos para o país como um todo, mas para algumas regiões, sim. Por exemplo, na bacia do rio Xingu no Mato Grosso há mais de 300 mil hectares de matas ciliares degradadas ou desmatadas. Isso sem contar as áreas de reserva legal.


O fato é que há sim um grande passivo, e temos que encontrar formas inteligentes de recuperá-lo, devolvendo vegetação nativa de onde ela nunca deveria ter sido tirada. A proposta defendida pela CNA – relatório Aldo Rebelo – simplesmente elimina esse passivo ao dizer que não é mais necessário recuperá-lo. É um prêmio a quem desrespeitou a lei e uma ameaça à integridade de nossos ecossistemas.
O fato de "grande parte das terras do país" pertencerem a particulares não sentencia a necessidade de imposição de reservas legais nesses imóveis. A propriedade privada não é uma situação imutável. O que hoje é privado pode deixar de ser sob certas circunstâncias. Repare que o Raul, assim como o Smeraldi, foge o problema fundamental da questão do passivo ambiental existente que é a necessidade de destruir áreas agrícolas no processo de recuperação. É preciso encarar esse problema.

IHU On-Line – O Código Florestal foi reformulado nos anos 1960. Hoje, com uma conjuntura ambiental e econômica diferente, que aspectos a reforma no Código Florestal deveria considerar?


Raul Silva Telles do Valle – Deve considerar, sobretudo, mecanismos econômicos de incentivo à conservação e recuperação. Por exemplo, defendemos que uma reforma na lei atual não anistie desmatamentos ilegais, mas permita que o proprietário que estiver numa área apta à agricultura e já tenha investido recursos para melhorá-la possa compensar sua reserva legal recuperando áreas menos apropriadas, cujo uso econômico é baixo e que, via de regra, estão causando permanentemente prejuízos à sociedade, assoreando rios, desmoronando encostas, interrompendo o fluxo de fauna e flora, contribuindo com enchentes etc. Essa é uma reforma inteligente, que olha para frente, na lógica de criar um mercado para florestas nativas no país, que possa manter áreas hoje preservadas e recuperar áreas hoje degradadas.
Este é um mecanismo novo proposto por Raul. O que ele está dizendo é o seguinte: um proprietário que tenha uma área totalmente desmatada, mas muito produtiva deve ser incentivado a recuperar sua RL não nessa área, mas em outras áreas com produção de menor nível tecnológico e menor produtividade. Ocorre que isso tem implicações que os verdes se esforçam para não enxergar. Essa lógica fará produtores mais tecnificados e capitalizados engolir imóveis menores, menos tecnificados e menos capitalizados alterando a estrutura fundiária das regiões. Em outras palavras, isso gerará êxodo rural e concentração fundiária. Esses efeitos colaterais precisam ser avaliados e, caso se confirme sua ocorrência, precisam ser remediados. Fechar os olhos para eles é o primeiro passo para uma reforma inconveniente.

IHU On-Line – Quais as vantagens e desvantagens do atual código florestal?


Raul Silva Telles do Valle – A vantagem é que ele manda proteger áreas importantes para a produção de serviços ambientais, muito embora estudos recentes sobre faixas ripárias, por exemplo, indiquem que ele é insuficiente. Mas ele traz a ideia de que o dever de proteger é de todos, e não apenas do Estado. A desvantagem é que ele não tem medidas de apoio e incentivo, mas apenas de punição. Com os muitos anos de leniência da sociedade com sua aplicação, não dá para pensar que apenas com multas vamos resolver o problema do passivo. Elas são fundamentais, mas insuficientes. Temos que abrir um novo caminho de incentivos econômicos, de forma que o proprietário que está de acordo com a lei perceba vantagens concretas na hora de pegar um crédito agrícola, comercializar sua produção, pagar imposto rural etc.
Gosto do Raul, mas me impressionam como ele as vezes entorta o mundo para encaixar na interpretação dele. O Código Florestal não traz a idéia de que o dever de proteger é de todos e não apenas do Estado. Muito antes pelo contrário. O Código Florestal EMPURRA O ÔNUS DA PRESERVAÇÃO APENAS para os produtores rurais. Ele tira da sociedade urbana a noção de que ela é também responsável pelos custos e agruras inerentes ao processo de preservação florestal. O Código Florestal deixa o brasileiro urbano confortavel em suas cidades poluídas e sem APPs exigindo que os produtores rurais arquem sozinhos com os custos da preservação ambiental. Isso é um desserviço ao próprio processo de concientização da sociedade sobre a necessidade de preservação porque cria uma noção errada no brasileiro urbano de preservar é coisa que outros devem fazer por eles.
Quanto a questão dos serviços econômicos o Raul tem razão.

Veja a entrevista completa em Instituto Humanitas Unisinos

Em tempo, não sei quanto a vocês, mas vejo aqui e no editorial do Roberto Smeraldi elementos suficientes para a construção de um acordo que reforme o Código Florestal estruturalmente.

Comentários

Luiz Henrique disse…
Se partimos do principio de devolver a vegetação nativa de onde ela nunca deveria ter sido tirada chegaremos ao descobrimento do Brasil e como atual legislação ambiental é retroativa, Pedro Alvares Cabral, Tomé de Souza, Duarte da Costa e Mem de Sá não passam de criminosos.
Luiz Prado disse…
Luiz Henrique - E, no caso da Mata Atlântica, teríamos mais Mata Atlântica do que na descoberta do Brasil, já que a lei empurrada nos parlamentares como se fosse de "defesa do meio ambiente" ampliou em muito o conceito botânico e fito-geográfico de Mata Atlântica.

Uma das coisaas que esses "ambientalistas" sempre sonegam INTENCIONALMNENTE é que grande parte do tal "deficit" se deve ao Poder Público, como noiticia, hoje, a Folha de São Paulo:

"De 251 unidades de conservação federais, 188 ainda abrigam terra particular, somando 20 milhões de hectares

Extensão equivale ao Estado do Paraná e faz com que objetivos de preservação acabem não sendo cumpridos."

As UCs em geral são UCs de papel que eles querem tomar na mão grande dos proprietários - isso mesmo, tomar de forma criminosa criando obstáculos progressivos para os proprietários deixarem de usar a terra, em lugar de fazer com que se dê transparência às centenas de milhões de reais arrecadados sob a máscara das "compensações ambientais" e que hoje são aspergidos em chuveirinho sobre as ONGs amigas.
Decio Pedroso disse…
Ambientalistas e ecologistas, efetivamente, me cansam.Há alguns bem intencionados, românticos e sonhadores. Há outros, entretanto, com missões muito específicas: bloquear a produção agropecuária brasileira (estão trabalhando a soldo de outros mercados produtores). Mas, também existe um outro tipo de ecoambientalista: aqueles que querem impedir a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte por exemplo. Eles estariam interessados em nos vender usinas atômicas? Elas seriam mais seguras que aquelas do Japão, que apos o terremoto estão a ponto de explodir?Decio Pedroso