Senado retoma debates sobre o Código Florestal

A Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) promoveu um debate, na tarde desta sexta-feira (5), para avaliar os custos e os impactos econômicos decorrentes da recomposição ambiental de áreas produtivas, dentro da discussão do novo Código Florestal (PLC 30/2011). O requerimento para o debate foi apresentado pela senadora Ana Amélia (PP-RS).
Preço alto

O procurador da Fazenda Nacional, Luiz Carlos Silva de Moraes, lembrou que o Brasil tem 58% de vegetação nativa e disse que o "grande problema" é o que fazer com essa terra. O procurador citou estudos que mostram que a concentração populacional coincide com as regiões com mais necessidade de recomposição ambiental. Para o procurador, é preciso "engenharia de produção" e é preciso urgência na aplicação das medidas.

Luiz Carlos Moraes ainda afirmou que a manutenção do meio ambiente não é favor, mas uma necessidade pública e destacou o preço de uma possível recomposição ambiental. Ele lembrou que, de acordo com a legislação, o poder público deve dar as mudas de espécies nativas para recuperar áreas degradadas. Só para essa medida, seriam necessários R$ 380 bilhões. De acordo com o procurador, o novo código pode aliviar a situação, mas não vai resolver. Moraes disse que a sociedade vai pagar essa conta por meio de tributos ou por meio de aumento de preços dos alimentos. - Todos queremos um meio ambiente mais bem preservado, mas a que preço? - questionou o procurador.

O assessor econômico da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul) Antônio da Luz disse que um dos papéis do Brasil é ser um país referencial nas questões ecológicas, com um bom nível de preservação ambiental.

Segundo Antônio da Luz, a demanda mundial por alimentos vai aumentar muito nas próximas décadas e o Brasil passa a ter um papel fundamental nesse cenário. O assessor da Farsul disse que o Brasil tem uma condição rara, que pouquíssimos países têm, pra produzir alimentos. Para ele, a demanda por alimentos pode vir até a provocar guerras, e o Brasil pode ser o diferencial entre o conflito e a paz.

No Rio Grande do Sul, informou Antônio da Luz, 95% da produção agrícola trabalham com captação de carbono, que por meios naturais ou artificiais diminuem o efeito estufa e o aquecimento global.

Antônio da Luz reconheceu a importância de aliar os interesses econômicos, sociais e ambientais na produção agrícola, mas criticou o novo Código Florestal por conta dos possíveis impactos na economia do Rio Grande do Sul. Segundo o assessor da Farsul, a aplicação rigorosa da nova legislação pode diminuir em R$ 14 bi o Produto Interno Bruto (PIB) do estado e também pode significar menos 1,3 milhão de empregos. - Não é com o código do jeito que está que vamos conseguir equilibrar todas essas questões - criticou.

Injustiças

A importância de uma nova legislação ambiental também foi destaque no debate. O secretário de Agricultura do Estado de Rondônia, Anselmo de Jesus, disse que o atual código florestal comete "várias injustiças" com o agricultor. O secretário citou como exemplo o limite de exploração de apenas 20% da propriedade familiar na Floresta Amazônica. Anselmo de Jesus cobrou urgência na aprovação do novo Código Florestal. - Uma nova legislação é de muita importância - disse Anselmo de Jesus.

O secretário também cobrou mais reconhecimento para os estados que preservam a floresta amazônica e destacou a Agricultura de Baixo Carbono (ABC) como um exemplo positivo que alia produção com preservação ambiental. Anselmo de Jesus ainda disse que espera que Rondônia mostre para o Brasil um novo modelo de produção agrícola.
O gerente de Uso Sustentável da Água e do Solo da Agência Nacional de Águas (ANA), Devanir Garcia dos Santos, disse que o novo Código Florestal pode colaborar para um melhor uso da água e do solo. Ele lembrou que 18% da água potável do mundo estão no Brasil e uma das funções da ANA é conciliar a gestão do uso da água com o uso do solo. O gerente da ANA disse que a quantidade e a qualidade da água estão diretamente relacionadas com a condição e a preservação do solo. Para Devanir dos Santos, o respeito ao solo é o primeiro passo para uma produção sustentável. - O problema não é produzir ou deixar de produzir, mas sim produzir adequadamente - afirmou.

O gerente da ANA ainda defendeu a manutenção de 30 metros de mata ciliar, conforme prevê o novo Código Florestal, e de 50 metros de mata nativa na área de nascente. Devanir dos Santos, porém, criticou o novo código pela previsão de possibilidade de redução de metragem de preservação de área nativa e por permitir a possibilidade de anistia a quem desmatou. Afirmou que é preciso valorizar quem cumpriu a lei. - Quando não respeitamos a natureza, ela também não nos respeita. O preço que vamos pagar é muito caro - lamentou.

Êxodo rural

Edson Martins, representante da Confederação Nacional de Municípios (CNM), disse que as questões ambientais sempre preocuparam a instituição. Martins citou estudos da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) para dizer que o homem do campo pode ficar em situação difícil e migrar para a cidade, caso a atual legislação ambiental seja rigorosamente aplicada.

Segundo Edson Martins, o atual Código Florestal pode comprometer vários setores do campo, desde a produção de arroz até a criação de búfalos - que, em algumas situações, estariam ilegais de acordo com o código atual. O representante da CNM disse que 5 milhões de pessoas podem migrar para a zona urbana - e isso causaria um grande impacto nos municípios. Martins ainda afirmou que o novo código poderia resolver a situação, trazendo para a legalidade várias atividades rurais. - A participação de todos os setores é fundamental para a aplicação do código em todo o país, buscando um desenvolvimento mais sustentável - afirmou.

A senadora Ana Amélia lembrou que um possível êxodo rural em grandes proporções pode comprometer o consumidor urbano, já que os alimentos e outros produtos primários vêm do campo.

Participação popular

A participação popular também foi destaque. Várias perguntas foram enviadas pelo twitter e por e-mail. A senadora Ana Amélia destacou a mensagem enviada por Ciro Fernando Siqueira, de Paragominas (PA), que perguntou se é necessário destruir áreas agrícolas para recompor área ambiental. O representante da Farsul, Antônio da Luz, disse que há áreas para plantio e há áreas destinada a preservação. Assim, não é necessária a destruição.

Outro e-mail, enviado por Jones Santos, questionava por que não foram realizadas audiências públicas na região amazônica com "atores envolvidos" na questão ambiental.O secretário de Agricultura de Rondônia, Anselmo de Jesus, respondeu que vários estados da região, como Acre e Roraima, receberam audiências públicas para debater o novo Código Florestal.

O debate também foi acompanhado no local por servidores públicos, representantes de entidades ambientais, estudantes e interessados no tema. Eduardo Candorelli questionou a diferença de opinião entre o Ministério do Meio Ambiente, que defende 100 metros de mata ciliar, e a Agência Nacional de Águas (ANA), que defende 30 metros. O gerente da ANA, Devanir Garcia dos Santos, disse que a medida de 30 metros é suficiente do ponto de vista dos recursos hídricos.

Também presente no seminário, Raul do Vale, representante do Instituto Socioambiental (ISA), questionou alguns dados dos custos da recomposição ambiental apresentados pelo procurador Luiz Carlos Moraes. Segundo Raul do Vale, a experiência do ISA com pequenos produtores mostra que a recomposição é possível com valores considerados razoáveis. Raul do Vale lembrou que apesar do custo, as perdas são grandes quando ocorrem deslizamentos e enchentes - que podem ocorrer por conta da degradação do meio ambiente.

O procurador respondeu que os estudos que apresentou são apoiados por entidades ambientais e citou legislação do estado de São Paulo que impõe até 80 espécies diferentes por área de recuperação. Segundo Moraes, essa imposição legal eleva o custo da ação.

Trabalho da CRA

O senador Acir Gurgacz (PDT-RO), presidente da comissão, lembrou os trabalhos da CRA no primeiro semestre e destacou a presença de especialistas, cientistas e agricultores nos debates. Acir Gurgacz também louvou a participação popular, que ocorreu em todos os debates, por telefone e por meio da internet. De acordo com o senador, os 13 seminários realizados foram instrumentos para que a CRA possa apontar soluções e cumprir seu papel de auxiliar a agricultura e o país.

Acir Gurgacz ainda elogiou a persistência do agricultor brasileiro e a participação do governo no setor. No entanto, o senador cobrou mais apoio para o produtor familiar. O parlamentar também ressaltou a importância do debate sobre o novo Código Florestal e defendeu o equilíbrio entre a produção e a preservação ambiental. - A agricultura brasileira bate recordes sucessivos e se consolida como uma das mais fortes do planeta - afirmou.

O senador citou dados do Ministério da Agricultura, para dizer que o Brasil vai precisar integrar mais 6 milhões de hectares até 2020, para acompanhar a demanda pela produção agrícola. Daí, a importância de debater os custos e os impactos da recomposição ambiental de áreas produtivas.

A reportagem é de Tércio Ribas Torres / Agência Senado

Comentários

Flávia e Wagner disse…
Gerd Spavorek, citado na matéria de 7/8/2011 (Floresta/fome no mundo) disse que o país possui 45.000.000 ha (12,58% do total da área de uso do solo) para recuperar, caso o código florestal (Cf) não seja alterado.
O Ilustríssimo Dr. Luiz C. Silva de Moraes, jurista renomado do direito ambiental, alerta que, para recuperar 450.000 km2 serão gastos R$ 380 bilhões apenas com mudas e, de forma errada, no meu entendimento, critica o Estado de São Paulo que impõe legalmente a introdução de 80 espécies por área a recuperar que, penso, ser o mínimo aceitável caso não tenha banco de sementes em algum fragmento florestal no entorno da gleba.
A Mata Atlântica detém o recorde de plantas lenhosas (angiospermas) por hectare (450 espécies no Sul da Bahia), cerca de 20 mil espécies vegetais, sendo 8 mil delas endêmicas, além de recordes de quantidade de espécies e endemismo em vários outros grupos de plantas. Para se ter uma idéia do que isso representa, em toda a América do Norte são estimadas 17.000 espécies existentes, na Europa cerca de 12.500 e, no continente africano 45.000.
Resumindo, as pessoas mal informadas e/ou sem conhecimento científico, leiam o que disse o ongueiro do ISA Raul do Vale, acham que é apenas colocar algumas mudas de árvores no chão que estaremos efetivando a recuperação florestal. O objetivo da recuperação, para proteção/preservação ambiental, é atingir a dinâmica da população (flora e fauna) e sua inter-relação com solo e água.
O produtor pode arcar com isso? O governo pode custear a recuperação, não apenas os R$380bi em mudas, e ainda pagar pela ocupação do solo produtivo (no mínimo 8@/ha/ano que é o que rende ao produtor o aluguel de pastagem)? A sociedade pode suportar esse desvio de interesses do dinheiro público? Ou vamos, em detrimento à natureza e aos cidadãos, brincar de recuperar área desflorestada como faz o ongueiro Raul do Vale do ISA?

Wagner Salles