O dia em que foi crime ser produtor rural no Brasil

Zero hora de hoje, 11 de dezembro de 2011, encerrou-se o prazo estipulado no decreto que regulamenta a lei de crimes ambientais para que os proprietários de imóveis rurais averbem a Reserva Legal de seus imóveis em cartório como exige o Código Florestal vigente. A partir de hoje, o dono de imóvel rural que não averbou sua Reserva Legal é um criminoso.

Estima-se que cerca de 90% dos produtores rurais brasileiros não tenham como atender as exigências da lei vigente. Se a estimativa estiver correta, 90% da produção rural nacional passou a ser crime a partir da zero hora de hoje.

Amanhã, segunda-feira, 12 de dezembro de 2011, o governo publicará uma edição extraordinária do Diário Oficial de sexta-feira, 9 de dezembro, dando, pela 4ª vez consecutiva, mais prazo para que os donos de imóveis se adequem à lei.

Entre o primeiro instante de hoje e a canhestra publicação do adendo do Diário Oficial de anteontem amanhã, segunda-feira, no Brasil, ser produtor rural de alimentos é crime ambiental. Serão cerca de 35 horas ao longo das quais um dos maiores e mais importantes produtores agrícolas do planeta considerou oficialmente como crime sua produção rural.

A publicação amanhã de uma ato jurídico com a data de anteontem fará desaparecer, como que por mágica, essas trinta e poucas horas criminosas em que foi crime ser produtor rural no Brasil. Será como se elas nunca houvessem existido. Mas elas, e o absurdo que elas representam, existiram.

Em respeito e reverência aos brasileiros e brasileiras que teimam em viver no campo, que teimam em produzir o que quer que seja, que teimam em gerar os superávits que dão aos brasileiros urbanos os prazeres e o conforto de seus produtos importados, que teimam em carregar essa país nas costas às expensas de seu suor; que são vistos a partir de preconcepções, que são tratados como culpados pela urbe obesa e aterrorizada por um ocaso ambiental “pesadelático”; em respeito e reverência a esses brasileiros e brasileiras este blogger restará em vigília e em jejum pelas próximas trinta e poucas horas enquanto for crime ser produtor rural nesse país.

Espero que essas próximas horas, em que os milhões de produtores rurais brasileiros tenham sido transformados em milhões de criminosos, ensejem uma reflexão sobre a necessidade de se proteger com eficácia o meio ambiente sem violentar culpados que não existem.

Comentários

Luiz Prado disse…
O "código florestal" não é, definitivamente, um instrumento de proteção nem remotamente eficaz de meio ambiente.
Luis Pereira disse…
Ciro,

Um bom dia e um bom domingo para tí e para tua família.

Mais uma vez receba minhas felicitações pela qualidade e fina inteligência com que escreve e explora este assunto.

Resta-nos a esperança de dias melhores, apesar dos pesares.

Luis Pereira
ruy edson disse…
Ciro,

Na verdade, as minhas últimas 36 horas como criminoso ambiental oficial foram tão aterradoras quanto todas as outras que passamos nos últimos 6 anos, desde que começamos a tentar averbar reservas e APPs da vida, tentando resolver esse embrulho ambiental dos infernos, sem deixar de produzir alimentos.
Em tempo: o corretor de texto do Google não reconhece a palavra "ambientalista".
Luiz Henrique disse…
Neste domingo e na segunda até a hora da Presidente renovar o Decreto, estarei escondido no Mato.
Braso disse…
O que me vem a cabeça é que começo a ver sentido na teoria de Buckminster Fuller de que a maior parte do que transpira dentro da atividade humana da realidade é totalmente invisível, inodora e intangível
Ele dizia que 99 % da realidade só podiam ser compreendidos pela mente metafisica do homem, guiada por alguma coisa que se podia sentir como verdade, como agricultores somos auto suficientes de microcomunicacão e o restante da humanidade macrocomunicacão, não podemos desistir de dizer a nossa verdade a todos.