Agricultura sintrópica também é agro

Ernest Gotsh, guru da agricultura sintrópica
Pode não ser business, pode não ser tech, mas é pop e é agro. O agricultor sintrópico é também, e antes de tudo, um produtor rural, um agricultor. “Essa é minha profissão, agricultor, sem dúvida”, disse ao Globo Repórter o economista João Tuono, um dos alunos do suíço Ernest Gotsh, guru da agricultura sintrópica.

Um leitor do blog me pediu um comentário sobre a matéria da revista Veja dessa semana que tratou da tal agricultura sintrópica. Tenho lido e ouvido muita bobagem sobre o trabalho de Ernst Götsch desde que a agricultura sintrópica entrou na moda por meio da novela das oito. A matéria da revista Veja trouxe várias dessas bobagens.

Mas eu tenho mudado muito a minha forma de ver essas esquisitices no agro. Uma dessas mudanças vem da revelação que lancei logo no primeiro parágrafo deste post. O agro não se resume ao agronegócio. Na verdade essa foi uma armadilha que nós inventamos e na qual nós mesmos caímos felizes.

Quando a academia trouxe a noção de agronegócio no final dos anos 50, a ideia era fazer uma abordagem para além dos limites das propriedades, era entender como as outras partes do negócio agrícola, a indústria de insumos, de transporte, de processamento, de varejo e consumo, interagiam entre si e com as propriedades rurais.

Foi uma noção revolucionária que ampliou os horizontes da propriedade rural e integrou o produtor a uma imensa cadeia industrial. Enquanto frameowrk acadêmico, a abordagem do agronegócio foi um grande sucesso ao permitir ganhos de eficiência e produtividade nas diversas cadeias produtivas. Mas enquanto frameowrk político a abordagem do agronegócio foi um desastre.

Os esquerdopatas brasileiros usaram esse recorte, meramente acadêmico, para criar uma divisão política clara entre nós e eles. A esquerda bocó inventou a noção de que o agronegócio é do mal e o resto é do bem e nós, do agronegócio, sentimos uma tendência quase irresistível de concordar com a esquerda bocó nesse aspecto.

Esse recorte é claro nas matérias que tenho lido e ouvido sobre agricultura sintrópica. Os jornalistas, como de praxe, profundamente desinformados, tanto sobre a agricultura sintrópica, quanto sobre a agricultura convencional, traçam claramente a distinção entre o bem da agricultura sintrópica e mal da agricultura convencional.

Quando me pediram para comentar a matéria da Veja a primeira impressão que eu tive foi a de criticar a falta de racionalidade econômica da agricultura sintrópica e os despautérios técnicos escritos pelo jornalista, como dizer que o calcário da agricultura convencional é tóxico e contamina o lençol freático, por exemplo.

Mas depois de refletir um pouco me veio uma segunda impressão. Como escreveu Guimarães Rosa em Grande Sertão: Veredas, "tudo se finge, primeiro; germina autêntico é depois". Criticar a agricultura sintrópica e defender a agricultura convencional é cair na armadilha dos esquerdopatas; é insistir na guerra fratricida do nós contra eles.

O agricultor sintrópico, o orgânico, o ecológico, o pequeno, o médio, o grande, o familiar, o empresário, são todos agricultores antes de qualquer recorte. Todos amam a terra, todos sofrem com as inconstâncias do clima, todos amam seus animais, todos necessitam de desenvolvimentos tecnológicos, todos lidam com custos de produção crescentes. Uns faturam mais, outros menos, mas, de uma forma ou de outra, todos somos produtores rurais. Somos todos irmãos.

Acho que nós, da agronegócio, deveríamos refletir sobre isso. Eu já fiz a minha escolha e desejo boa sorte a você.

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