Após a audiência pública da Comissão Especial do Código Ambiental ocorrida ontem, 02 de março, em Imperatriz, no Maranhão, o Deputado Aldo Rebelo, relator da Comissão Especial, concedeu uma entrevista exclusiva ao blog do Código Florestal. Leia abaixo a íntegra da entrevista.
Blogger: O Sr. é ruralista?
Deputado Aldo Rebelo: Não. Eu não integro a bancada da agropecuária e também não integro a bancada ambientalista. Mas deputados de todos os partidos, inclusive do meu partido, do PV, do PDT, PSB, integram ambas as bancadas. Mas eu, como tenho me dedicado a outra temática, não me filiei a nenhuma das duas bancadas e, aliás, era só suplente dessa comissão. Assumi a relatoria por um pedido de todos os partidos. Eu não requisitei, não foi uma proposta do meu partido, foi um apelo de todos os partidos da base do governo e da oposição e por isso eu assumi o desafio, como um desafio político e não como um especialista na matéria.
Blogger: Como o Sr. explica, ou a quê o Sr. atribui, declarações, por exemplo, do Greenpeace e do próprio Ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, de que o Sr. se bandeou para o lado dos ruralistas ?
Deputado Aldo Rebelo: Eu creio que é fruto da luta que se trava no mundo e no Brasil em torno da questão ambiental. A questão ambiental não está posta aí somente pela preocupação com o meio ambiente, que já seria uma razão muito nobre e muito generosa, porque, de fato, os crimes ambientais no mundo e no Brasil, exigem uma reação a altura para que sejam contidos. O problema é que a defesa do meio ambiente virou também uma bandeira, uma ideologia. Como diz o ex-vice presidente dos EUA, Al Gore, no seu livro A Terra em Balanço, para substituir a ideologia do combate ao comunismo, que perdeu muito da sua força pele fim da União Soviética, o meio ambiente e o ambientalismo podem fazer esse papel. O ambientalismo pode ser uma peça que serve aos países fortes para intervenções em nações e países mais fracos. A questão ambiental também serve a uma guerra comercial da agricultura frágil de países fortes contra a agricultura forte dos países fracos, como é o caso do Brasil. Eles usam essa questão para conter a áreas de fronteira agrícola e a área de fronteira mineral e também como forma de criar barreiras. Como a Organização Mundial do Comércio proíbe a criação de tributos para a competição entre países você cria as chamadas barreiras não tarifárias que são indiretamente jogadas contra os países mais fracos. Eles não podem criar tarifas, mas criam barreiras não tarifárias e algumas restrições ambientais também servem a esse propósito. E cria-se uma confusão muito grande, o que é mesmo a defesa do meio ambiente? O que é a defesa da agricultura brasileira? Isso confunde uma parte da esquerda que acha que, em razão da agricultura brasileira ter uma elevada concentração de renda e da propriedade, a forma de enfrentar essa concentração é ajudar a agricultura dos países ricos e eu não estou aqui para fazer esse papel.
Blogger: Antes de assumir a relatoria da comissão especial qual era a visão que o Deputado Aldo Rebelo tinha dessa questão do Código Florestal e da questão da legislação ambiental brasileira?
Deputado Aldo Rebelo: A minha visão vem da minha tradição de movimento estudantil que é a preocupação com as questões ambientais porque é necessário que haja leis que controlem o sistema capitalista que não nasceu para cuidar o meio ambiente e, ao mesmo tempo, eu trazia da comissão de relações exteriores a visão da guerra comercial, do uso do meio ambiente como instrumento de intervenção para colocar em dificuldade os paises mais fracos. Por ter essa visão a partir da comissão de relações exteriores é que eu procurei estar ligado a essa comissão especial para acompanhar o debate a partir desse ponto de vista, a partir desse posto de observação.
Blogger: A visão geral sobre o código florestal é a de que ele é parte de uma das legislações ambientais mais avançadas do mundo, que o Código Florestal é uma lei muito boa. Essa era a visão que o Sr. tinha antes assumir o posto de relator dessa comissão especial?
Deputado Aldo Rebelo: Eu tinha uma visão ainda anterior ao Código Florestal. Eu sou um leitor muito atento do Patriarca da nossa independência, José Bonifácio de Andrada e Silva, que considero ser o maior de todos os brasileiros de todos os tempos. E eu vejo no José Bonifácio a preocupação com o meio ambiente, a preocupação com a floresta, não desligada da questão econômica. Porque a reserva que ele propunha, a reserva legal que ele propunha, um sexto da propriedade, primeiro que não eram propriedades como as de hoje, eram propriedades que se media em léguas, as chamadas sesmarias, segundo que as reservas visavam o suprimento de madeira para a industria naval de guerra, para a industria naval civil, para energia, para sustentar a atividade econômica e a construção civil. Era uma concepção multidisciplinar do que seria essa reserva legal. O Código de 1965 eu acho que é uma peça muito bem feita e avançada. Envolveu gente da mais elevada qualidade intelectual, o saudoso, que eu conheci inclusive, o Desembargar Osny Duarte Pereira, que tem um livro anterior ao código, da década de 50, que trata da legislação florestal no Brasil e no mundo. O Código florestal de 65 era muito bom, o problema é que ele praticamente deixou de existir com as mudanças que foram incorporadas a ele a parte de 1965, principalmente dos anos 90, as medidas provisórias, as leis que foram aprovadas, as resoluções do Conama, portarias, etc. Então é preciso olhar o Código de 65, a sua visão geral, sua contribuição, mas é preciso atualizá-lo. Ele está defasado inclusive do ponto de vista da defesa do meio ambiente. É preciso avançar nesse aspecto.
Blogger: Quem acompanha os trabalhos da comissão, eu particularmente, tem a impressão de que o Sr. se assustou com o que viu no campo, quando conversou com as pessoas e viu os conflitos locais de aplicação da lei. Isso é verdade?
Deputado Aldo Rebelo: Eu parti do conceito de Mao Tse Tung que dizia parta dos fatos, parta da realidade. Ele tinha uma certa desconfiança da formulação dos intelectuais e gostava de ouvir as pessoas comuns. O que vi no Paraná, o que eu vi em Rondônia, no Mato Grosso é impressionante. É uma coisa devastadora. É injusto. Mais injusto, é o medo que se espalha entre os agricultores no Brasil, a pequena, a média e a grande. Você não pode enfiar dentro de uma concepção jurídica estreita, que é uma camisa de força, a realidade de um país tão diverso, tão desigual, para o bem e para o mal, como o Brasil. Eu fiquei estarrecido. Fiquei estarrecido também com a omissão e com a cumplicidade de uma parcela da intelectualidade, de setores urbanos, da própria mídia, em relação a essa tragédia.
Blogger: Recentemente em Novo Progresso, no Pará, uma equipe de TV da Rede Bandeirantes que fazia a cobertura de uma operação do Ibama no local, foi presa pela Força Nacional de Segurança que dava cobertura ao Ibama. Agentes pediram que os repórteres apagassem o material filmado e a equipe foi detida na sede do Ibama até que operação fosse concluída. O Sr. acha que a luta pela preservação ambiental, que é necessária e tem que ser empreendida, justifica esse tipo de excesso?
Deputado Aldo Rebelo: De forma nenhuma. E isso não é raro. Episódios como esse da TV Bandeirantes não são isolados. Esses abusos são cometidos contra pessoas, contra instituições. Houve um caso em Boa Vista que um fiscal do Ibama deu ordem de prisão para várias pessoas numa ocupação irregular numa área perto de Boa Vista e quem reclamou foi preso também. O Brasil não precisa se uma Gestapo ambiental. O Brasil precisa de uma política ambiental de preservação, de fiscalização, de extensão. O caso da Força Nacional, que nós criamos, eu estava no governo, para combater o narcotráfico no Rio de Janeiro. Eu vi essa Força Nacional desaparecer do noticiário, achei que tivesse sido desativada. Quando agora percorri o Mato Grosso, Rondônia, o Pará, ela está toda acantonada a serviço do Ibama, junto com a Polícia Federal, com helicópteros, para fazer intervenção, prender agricultores, ajudar em operações secretas. O Estado só vai aparecer para a agricultura dessa forma, com helicópteros, com a força nacional?
Blogger: Eles têm autorização do Ministro da Justiça para usar armas letais nessas operações.
Deputado Aldo Rebelo: Eu acho que é um abuso também do próprio Ministério da Justiça.
Blogger: O código florestal de hoje impões o ônus da preservação aos produtores rurais de maneira que mais preservação implica em mais custos aos produtores. O Sr. acha possível desvincular a preservação das áreas privadas? Quando nós veremos nossos agricultores apoiarem medidas que levem a mais preservação?
Deputado Aldo Rebelo: Perfeito. Nós estamos estudando, com apoio técnico e científico da Embrapa e de Universidades, qual é a melhor forma de Reserva Legal. Nós não vamos abrir mão desse conceito. Eu acho que, para o bem, esse conceito foi criado no Brasil, não há análogos nem na Europa, nem nos Estados Unidos. O que é preciso saber é se a melhor forma de implementar é por propriedade, por bioma, ou por bacia ou micro bacia.
Blogger: Depois do encerramento das audiências públicas qual é o cronograma da comissão especial?
Deputado Aldo Rebelo: Eu tenho que apresentar, mesmo que seja um pré-relatório, até o fim de março. Esse ano é um ano mais curto por causa das eleições.
Blogger: Quando a mídia urbana e os formadores de opinião, em geral gente que não foi ao campo ver os conflitos de aplicação da lei como o Sr. foi, começarem a escrever sobre o seu relatório o Sr. acha que há o risco dele ser politicamente destruído?
Deputado Aldo Rebelo: Eu creio que não. Eu creio que haverá uma responsabilidade política mínima para que se permita um contraditório. O relatório ao ser apresentado tem o direito de ser defendido, não apenas pelo autor, mas por aqueles que têm alguma identidade por ele.
Blogger: O que o Sr. gostaria de dizer para os produtores rurais brasileiros que estão hoje sofrendo dos rigores do Código Florestal, como aquele produtor que o Sr. encontrou em Rondônia e que trocou sua terra por um carro velho e foi morar na cidade por não ter como cumprir as exigências das leis ambientais.
Deputado Aldo Rebelo: Que essas pessoas resistam por mais um tempo. Que tenham mais um pouco de fé, de esperança, de otimismo. Porque outra característica do ambientalismo é uma visão pessimista da humanidade, do futuro. Não é uma visão de confiança. Nós queremos um otimismo crítico, mas otimismo. Que essas pessoas tenham paciência porque o Congresso haverá de oferecer uma alternativa para aquelas pessoas, para que elas defendam o meio ambiente, mas continuem a viver, a produzir e a trabalhar no campo.
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