Destino de Reserva Legal

Mata é transformada em carvão e vendida a distribuidores em São Paulo

Por José Maria Tomazela, enviado especial do jornal Estado de São Paulo

Osvaldo de Oliveira recebe R$ 150 para cuidar do lote da sobrinha. Foto: Valéria Gonçalves/AE

NOVA ANDRADINA - Com a netinha Eduarda, de 4 anos, agarrada à perna, o assentado Almerindo Ribeiro retira o resto de carvão do forno e vai enchendo os sacos de ráfia usados. Cada um, com cerca de 20 quilos, será vendido por R$ 3. A última fornada rendeu quase uma tonelada de carvão - receita bruta de R$ 135. Se a chuva não atrapalhar, ele enche o forno quatro vezes por mês. Madeira para queimar não falta: troncos e galhos derrubados e tostados pelo fogo se espalham por uma área de 80 mil metros quadrados.

O carvão sustenta a família do assentado - ele, a mulher e duas netas - no lote que recebeu do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), no Assentamento Teijin, em Nova Andradina, no sudoeste de Mato Grosso do Sul. As árvores que ele está queimando fazem parte da reserva legal da fazenda Teijin, de 27,5 mil hectares, desapropriada em 2004 pelo Incra.

No início da década, era uma área preservada que serviu de abrigo para onças, bugios e outros animais. Chegaram como refugiados sobreviventes das terras alagadas pela formação do lago da Hidrelétrica Sérgio Mota, no Rio Paraná. Cerca de 200 das 1.124 famílias assentadas se instalaram na reserva legal da fazenda.

No terreno da assentada Otelina Leite Lobo, de 80 anos, o único forno não dá conta de toda a madeira cortada e enfileirada em uma área de 12 hectares. Uma parte foi vendida e levada de caminhão para uma carvoaria fora do assentamento. Ela é dona do lote, mas quem cuida de tudo é o filho, Deusdete Lobo, de 59, assentado há quase 20 anos no Casa Verde, um assentamento vizinho.

Inicialmente, Lobo disse que o forno estava desativado. Depois, com a evidência das paredes quentes e da fumaça, alegou que era de um vizinho. O barulho da motosserra também vem do lote vizinho, alega. Os troncos empilhados pelo terreno foram cortados com anuência do Incra, garante. "Vieram numa reunião e disseram que podia abrir 60% do lote." O assentado diz que sua mãe não invadiu a reserva. "Puseram ela aqui, coitada, no meio do mato."

O coordenador da Fetagri, Antonio Barbosa, também assentado, culpa o Incra pela devastação. O governo assentou mais gente do que cabia. Como as áreas desmatadas eram insuficientes, os assentados que ficaram sem lotes ocuparam a reserva. "Era gente que ficou anos acampada." Segundo ele, como o Incra não conseguiu retirar os ocupantes da mata, fechou os olhos para a devastação. "No início, foram considerados irregulares e não receberam verba para nada. Depois, o Incra autorizou o desmate de até 40% do lote, mas não fiscalizou e muitos cortaram tudo", relata Barbosa.

O Incra em São Paulo informou que a ocupação não interfere na reserva legal, pois foi constatado que a fazenda tinha mais matas do que os 20% exigidos por lei. Em novembro de 2007, o Estado já havia flagrado fornos de carvão na reserva da Teijin. Na época, o Incra informou que era crime ambiental e os assentados seriam excluídos. Informou ainda que as famílias alojadas em áreas cobertas por matas seriam transferidas para outro assentamento. Os assentados continuam no mesmo lugar, a mata, não.

Texto adaptado de reportagem publicada hoje no Estado de São Paulo. Leia a íntegra da reportagem .

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Em tempo, bom churrasco.

Comentários

emanuel disse…
Se isto esta no site, o MInc deve ter conhecimento...porque nao multa o INCRA?
> Emanuel
Anônimo disse…
ENQUANTO O LULA CONTINUAR FINGINDO OU ACREDITANDO MESMO QUE RESOLVEU OS PROBLEMAS DA POBREZA, ENQUANDO OS ECOCHATOS CONTINUAREM A FINGIR QUE SOMOS UM PAÍS MODERNO E RICO, TUDO CONTINUARÁ ASSIM.
A sustentabilidade passa também, pela condição humana: capacitação, educação, respeito, dignidade e modo de vida. Falar de desenvolvimento sustentável é falar em desenvolvimento humano e respeito ao homem e ao planeta.
reforma agrária não é dar terra, somente. junto com ela é necessário fornecer a infra-estrutura e desevolver a dignidade que o capitalismo expropriante já expropriou há muito. É fácil reclamar do índio que queima a floresta e que permite posseiros em suas terras; é fácil criticar o sem terra que após receber sua terra, derruba a mata ou vende a terra. Mas, cadê a estrutura para lidar com a terra, recuperar a terra e a sua própria dignidade de tantas agressões? O Estado tira. O Estado devolve ou finge que devolve?