Código Florestal: Comentários sobre as opiniões de Jorge Viana

Nomeado relator do Código Florestal no Senado, o senador Jorge Viana (PT-AC) tem na sua história política a proximidade com a guerra velada pela Amazônia. Engenheiro Florestal chegou ao Acre nos anos 80 com uma mão na frente e um dedo atrás. Tornou-se amigo do líder seringueiro Chico Mendes e dos ambientalistas que o rodeavam, Adrian Cowell, Mary Alegretti, Bruce Riche e Steve Schwartzman. Conheceu Marina Silva quando ela era seringueira e foi governador do Acre por dois mandatos.
O Senador deu uma entrevista exclusiva ao jornalista Eduardo Bresciani do estadão.com.br. Segue abaixo a integra da entrevista com comentários meus em vermelho. Ao final há um link para a página onde a entrevista foi publicada.

Como o senhor pretende trabalhar para chegar ao seu relatório sobre o Código Florestal?
Esse tema é da maior importância, é um marco regulatório. O Brasil é um país tropical, que tem a maior área de floresta tropical do mundo. Somando os diferentes biomas a gente chega a quase meio bilhão de hectares. Nós temos 20% da água doce do planeta. Mesmo sendo um país com esses números, o Brasil participa com apenas 4% do PIB vinculado a florestas no mundo. Ou seja, o Brasil ainda não começou a trabalhar economicamente as florestas, não podemos trabalhar a reforma do código florestal sem entender que floresta é a vantagem comparativa que o Brasil tem. O Brasil tem o privilégio de ter acima do solo um potencial econômico em que trabalhamos muito pouco.
Repare a forma viesada com que Viana aborda o tema. O Código Florestal não é uma lei que se aplica apenas à Amazônia. O Código se aplica, por exemplo, ao pampa gaúcho. Qual é o potencial econômico das florestas do pampa gaúcho? Ou do pantanal do Mato Grosso do Sul? Ou da Caatinga do Ceará? É um equívoco relatar o Código Florestal brasileiro, que regulará o uso das propriedades rurais do país inteiro, olhando apenas para a questão amazônica.
A linha que o senhor pretende trabalhar é que a floresta deve ser vista como uma vantagem e não como um problema?
Eu acho que tem um reparo a ser feito nessa discussão do código florestal. A floresta não pode ser visto como um problema. A floresta é a solução, é uma vantagem econômica. Para ser objetivo, pragmático, a discussão de cada dez anos sobre código florestal está muito mais vinculada em encontrar uma maneira de resolver passivo do que qualquer outra coisa. Isso tem que ser encarado como uma realidade.
As florestas são vistas como um problema porque o Código Florestal impõe o ônus de sua preservação aos imóveis rurais privados onerando a produção agrícola. São os equívocos do Código Florestal vigente que fazem das nossas florestas um problema agrícola. Por outro lado é um grata surpresa ver Viana dizendo que o problema do passivo precisa ser encarado. A turma de ecoxiitas de Marina Silva sempre se recusou a encarar a questão do passivo como um problema real. A própria Marina vem incorporando no seu discurso a necessidade de o Estado dotar os produtores rurais da capacidade de solucionar o passivo, mas essa mudança de postura é uma conseqüência do relatório de Aldo Rebelo. Antes de Aldo, Marina e seu ecofundamentalistas, achavam que os produtores deviam se lascar para recuperar o passivo por sua própria conta e ônus, que o papel do Estado era só mandar o IBAMA e Força Nacional cobrar o cumprimento da lei. Agora, depois do movimento em torno do Relatório Rebelo, que evidenciou a incapacidade dos produtores de fazê-lo, Marina e alguns dos seus Marina’s Boys começam a mudar a ladainha.
E como se resolve esse passivo?
Tem uma insegurança jurídica nas propriedades pequenas, médias e grandes em razão das alterações que a legislação ambiental sofreu nos últimos anos. Isso tem que ser resolvido. O Brasil é um dos maiores produtores de alimentos do mundo. Estes produtos não podem viver numa insegurança jurídica por conta do lugar em que são produzidos. Temos que encontrar uma maneira de dar segurança jurídica para os proprietários, estender a mão para eles através de uma lei bem feita, objetiva, para que quem queira sair da ilegalidade possa vir para a legalidade. Tudo isso tem de ser feito sem anistia para desmatadores e sem que você comprometa as APPs (Áreas de Preservação Permanente) futuramente. O código tem 69 artigos, já tem boa base de entendimento, seja do governo, do Congresso e dos diferentes setores da sociedade e tem uns pontos que merecem atenção. Em vez de começar do zero, temos que começar pelos pontos que podem aperfeiçoar a proposta.
Repare novamente na forma parcial como Viana enxerga o problema. O problema do passivo decorrente das mudanças recentes na lei dizem respeito novamente à Amazônia, onde o tamanho da Reserva Legal aumentou de 50% para 80% e quem desmatou legalmente 50% virou criminoso com a mudança na lei. Mas esse está longe de ser a maior fonte de passivos. Em estados de colonização mais antiga como São Paulo, Paraná, Goiás, Santa Catarina, grande parte das propriedades não têm mais nem os 20% exigidos pela lei vigente. A maioria delas não tem condições financeiras e recuperar esse passivo. Aldo Rebelo teve a mente suficientemente aberta para ver isso. Se Viana não abrir os olhos também para esse problema vai fazer outra besteira. Repito: o Código Florestal não é uma lei direcionada para a Amazônia. É uma lei que regula o uso das propriedades no Brasil inteiro.
O senhor já conseguiu mapear que pontos necessitam de mudança?
Não estou querendo entrar ainda nas discussões de mérito, mas eu ouvi dos senadores Waldemir Moka (PMDB-MT), Luiz Henrique (PMDB-SC) e Blairo Maggi (PR-MT) dizendo que para os produtores rurais a proposta votada pela Câmara é muito melhor do que aquela de 2010. Eles reconhecem que os produtores rurais ganharam muito com o código e eles reconhecem que temos de fazer um ajuste para que o meio ambiente não saia perdendo. O ponto central é este, se o meio ambiente perde os produtores vão perder, os produtos brasileiros vão perder segurança no mercado internacional, vão sofrer boicote. Então, até em defesa da agropecuária brasileira temos de fazer um trabalho de cuidar do meio ambiente, especialmente das áreas de APPs e reserva legal. É fundamental que o Brasil continue avançando no sentido de ganhar o respeito dos brasileiros e do mundo inteiro por fazer leis ambientais rígidas, com compromisso com as gerações atuais e futuras. O Brasil não pode trocar este espaço que ocupou para se tornar um país que está modificando a legislação deixando uma insegurança para o meio ambiente e as riquezas ambientais que nós temos. Seria uma temeridade fazer isso. Eu acredito no entendimento, não são mais de cinco ou seis pontos, todos eles vinculados a gente não fazer anistia, não passar a mão na cabeça daqueles que fizeram o desmatamento de forma proposital, separando estes dos que estão em situação irregular porque a lei mudou. Nós precisamos também separar a agricultura familiar, estes produtores não podem ficar sem um tratamento diferenciado, tendo em vista que a atividade deles é de baixo impacto ambiental.
Os produtos brasileiros podem perder credibilidade no mercado internacional porque, apesar de termos mais de 80% da Amazônia preservada e sermos o país mais florestado do planeta, os amiguinhos de Marina Silva estão mobilizando seus escritórios espalhados pelo mundo para difamar o Brasil junto a jornais e empresas estrangeiras contando apenas sua versão da história. Ao longo dos últimos anos o Estado brasileiro construiu sua credibilidade internacional se eximindo de arcar com sua parcela no custo da preservação florestal (vide os parques nacionais sem recursos para efetivação) e transferindo esse custo para o setor privado via Reservas Legais. Jamais alguém avaliou as conseqüências ruins dessa transferência de ônus. São dessas conseqüências ruins, sobre as quais ninguém refletiu, que vem os 411 votos favoráveis à subversão da lei vigente. Seu Viana, assim como Dona Marina, não enxerga isso.
O relator na Câmara, Aldo Rebelo (PC do B-SP), insistia que não havia anistia no projeto. O senhor enxerga diferente o texto aprovado na Câmara?
Eu estive com o deputado Aldo. Ele fez um trabalho de dois anos, andou o Brasil inteiro. Este trabalho tem que ser respeitado, mas houve um acirramento muito grande, o debate ficou acalorado demais e de certa forma na reta final da votação o próprio deputado Aldo me dizia que algumas propostas que dariam uma clareza ao texto ficaram fora. Algumas propostas que poderiam deixar o texto melhor posicionado em relação a APPs e reserva legal não ficaram claros porque houve acirramento. Uma das questões é que quando você fala de APPs, no jeito que o texto está, ficam dúvidas se pode ou não desenvolver novas atividades econômicas em área de APP. Para muitos técnicos, especialistas e juristas o texto permite, isso significa que você pode estimular novas atividades econômicas em APPs.
Se Viana acha que não haverá acirramento do debate no Senado pode tirar a capivara do banhado. O acirramento do debate na Câmara não veio da Câmara. Não dá para haver acirramento no debate de uma proposta que tem o governo e 411 deputados favoráveis. O acirramento veio dos ecoxiitas postos dentro do Congresso por Dona Marina Silva e seus Marina’s Boys. A turma da Marina não quer conciliar produção e preservação, nunca quis. Essa turma quer preservação ambiental a qualquer custo. Nas cabeças doentes da turma de Marina Selva, a ruína da agricultura nacional é um preço razoável a ser pago pela salvação do planeta. Cedo ou tarde os ecoterroristas de Madre Marina de Xapurí baixarão também no Senado.
Na Câmara, houve um acirramento. O que impede que isso se repita no Senado?
Houve certo desencontro, até mesmo com a chegada do governo no tema, que deu uma importante contribuição. A ministra Izabella Teixeira (Meio Ambiente) ajudou bastante, o deputado Aldo reconhece, mas houve um excessivo acirramento que eu espero que aqui no Senado a gente tenha um excesso de entendimento. Temos que discutir melhor o tema das cidades porque elas são hoje a expressão do que significa você destruir áreas de APP. Nas cidades, nenhum córrego foi canalizado, nenhuma encosta deixou de ser ocupada e estamos pagando o preço com vidas humanas. Se isso não for equalizado, nós vamos continuar contando os mortos. Vamos ouvir climatologistas, comunidade cientifica, pessoas do agronegócio e dar tratamento privilegiado àqueles da produção familiar. Vamos ouvir também os ex-ministros do Meio Ambiente, discutir com pessoas da agricultura.
Faço votos para que Jorge Viana cobre APP de 30 metros em rios que cortam cidades como o Tietê, o Pinheiros, a Lagoa Rodrigo de Freitas e o Lago Paranoá. Faço votos também que ele cobre Reserva Legal de 80% em imóvel urbano para a criação de parques florestais urbanos. Eu apoio. Código Florestal nas Cidades Já!! Aí a turma da urbe vai ver que o preservar ½ ambiente no dos outros é refresco.
O senhor tem uma história de parceria com a ex-ministra Marina Silva. Como ela pode ajudar nesse debate?
Ela está ajudando quando ela faz os alertas, apresenta ideias e propostas, com a experiência de vida que ela tem, uma experiência exemplar, como a experiência de ministério que ela tem. Ela conseguiu grandes avanços junto com o ex-ministro Carlos Minc. Mas eu não vou me prender só a ela. Uma pessoa que eu tenho ótima relação é o José Carlos Carvalho, ligado ao PSDB, que foi ministro e ex-secretário em Minas Gerais, o ex-ministro Rubens Ricupero, todos os que passaram ajudaram a construir essa credibilidade que o Brasil construiu depois do descrédito dos anos 80. Este é um patrimônio nosso. Não podemos deixar isso. Se o equilíbrio for encontrado, o agronegócio vai ganhar e o meio ambiente não vai perder.
Que ideias Marina Silva apresentou, Cara-Pálida? Que propostas ela fez? A mulher foi ministra por oito anos e nunca achou que fosse necessário ajustar o Código Florestal. Tudo o que ela fez foi aumenta a fiscalização porque acreditava que era tudo o que a lei precisava. Todos eles agiram assim. Volto a dizer, a credibilidade que o Brasil construiu internacionalmente veio da transferência do ônus da preservação florestal do Estado para o privado através da criação de parques nacionais de papel e apertando o cerco sobre a produção agrícola. É esse esqueleto que esta pulando do armário agora. Todos os ex ministros de ½ ambiente foram agentes dessa transferência e continuam crendo que é uma boa estratégia. Enquanto não se enxergar isso, vão malhar em ferro frio.
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Sugiro a leitura da entrevista na íntegra no Estadão. Algumas perguntas foram suprimidas por questão de tempo e espaço. Clique aqui.

Comentários

Luiz Prado disse…
ELES NUNCA SAIRAM DO ACRE E NEM DAQUELA ÉPOCA DO EXTRATIVISMO, AINDA QUE TENHAM GANHADO MAIS OU MENOS DINHEIRO E VISITADO, SEM VER, ALGUNS PAÍSES ESTRANGEIROS.
emanuel disse…
> Repare que ninguem fala em remuneração ao produtor por serviços ambientais. È mesmo um confisco de 20, 35 e 80% do nosso patrimonio. Como pode um negocio ter viabilidade economica perdendo 80% de seu potencial? Certamente, a Lei, mais uma vez, não "pegará" sem remuneração pois juquira e nem mata paga escola, medico, gasolina, supermercado. O Brasil nunca trabalhou seus biomas no exterior e cobrou da europa e EUA reservas semelhantes e agora querem transformar o Brasil em jardim do mundo para eles continuarem com suas vidas excelentes e nos tratando como Amaricos Latrinos!
Trata-se, por acaso, de uma apologia deflagrada de que "preservação" congela o país? De que os muitos que "tombaram" por defender uma causa que deveria ser de apelo mundial e não apenas regional,o fizeram em vão? De que o relatório do Sr. Aldo Rebelo é realmente um "avanço"? De que Marina Silva não passa de uma "embusteira" disfarçada de boa-moça? É um tremendo sofisma achar que ambientalistas só gostam de ricos! Mais ainda: que são irresponsáveis por colocar o "peso" e o "preço" da preservação nas costas dos ruralistas! E que fique bem claro, fazendo jus aos "bons ruralistas", era só o que faltava designar ainda o controle ambiental Federal(que infelizmente tem lá os seus percalços)nas mãos dos Estados e ainda "anistiar" os desmatadores perniciosos que não estão nem aí para ninguém! Não se trata de "ecoxiismo", nem alarde exagerado de idealistas pueris e ingênuos! No meio urbano há um contraste incontável de favelas que não estão em encostas com condomínios de luxo construídos em topo de "ex-morros", dantes specialmente protegidos, porque infelizmente já foram escavados! Construtoras que burlam a qualquer custo as normas ambientais , cada vez mais passam o trator sobre a lei, sobre a justiça e sobre e o que resta das nossas florestas! Vivem ansiosas à espreita esperando pelo "brinde" da anistia! Quanto aos ruralistas, é inconcebível que num país com uma área de mais de oito milhões e meio de quilômetros quadrados, produtores rurais sintam-se deserdados da sorte e da sociedade e "expulsos" de suas próprias terras! A lei é correta e existe para ser cumprida! Nossa própria Constituição já nos mostra que o direito de propriedade não é absoluto no país, especialmente
quando envolve questões como meio-ambiente ou reforma-agrária. É claro que o problema não se
restringe apenas ao valor econômico da propriedade, mas também está na gestão pública que não fiscaliza e quando o faz, os resultados são inócuos! Com tudo isso, façamos sinceramente,um
exame de consciência e coloquemo-nos diante de uma franca autocrítica: somos, de fato, um povo capaz de nos adequar às leis, especialmente leis rígidas que foram feitas para nós?