Existe o jeito errado de se fazer a coisa certa: Sobre a aproximação entre entidades do setor rural e ONGs ambientalistas

Guilherme Leal, candidato a vice presidente na chapa de Marina Silva, no lançamento da Colisão Brasil, Clima, Floresta e Agricultura
Já mostrei aqui no blog que algumas entidades do setor rural estão emprestando sua credibilidade junto a setores do agronegócio para legitimar a ação de ONGs ambientalistas. Chamei isso aqui de "agnwashing" em referência irônica ao termo "greenwashing". A aproximação do setor rural com o movimento ambientalista é um imperativo, mas existe o jeito errado de se fazer a coisa certa.

Evidência disso é ação de ONGs, que fazem parte da Coalizão Brasil Clima Floresta (e agricultura) no Supremo Tribunal Federal no sentido de derrubar o novo Código Florestal no tapetão. A Coalizão Brasil Clima Floresta (e Agricultura) também reúne entidades do agro em prol de uma aproximação entre duas facções que se digladiam bestamente há décadas. Veja: ONG ambientalista ligada à Abag, Unica e SRB pede ao STF urgência no julgamento do Novo Código Florestal

A boa notícia é: Assim com existe o jeito errado de se fazer a coisa certa, também existe o jeito certo.

Dono do maior rebanho bovino brasileiro, com 2,2 milhões de cabeças, o município de São Félix do Xingu, no Pará, é o primeiro do país a criar um comitê local do Plano de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (Plano ABC) e a pedir o apoio do Ministério da Agricultura (Mapa) para planejar suas ações. Necessário frisar: Ministério da Agricultura.

O Plano ABC estimula a integração de pecuária, agricultura e floresta em um esforço de ganhos de produtividade que resultam em redução da emissão de gases de efeito estufa pelo setor rural. O governo federal começou a implementar o projeto em setembro de 2011. Hoje,
19 estados e o Distrito Federal têm planos ABC regionais.

De acordo com Elvison Ramos, coordenador de Manejo Sustentável dos Sistemas Produtivos da Secretaria de Produtor Rural e Cooperativismo do Mapa, o ABC nacional não prevê a adesão dos municípios, mas a iniciativa de São Félix do Xingu aponta para um cenário promissor. “O ideal é que os municípios também comecem a se interessar por essa política pública de ações sustentáveis.” A redução de emissões de gases de efeito estufa (GEE), observa, é um compromisso assumido pelo Brasil durante a COP15, na Dinamarca, em 2009.

Esta semana, Ramos esteve reunido com representantes da ONG The Nature Conservancy (TNC), que trabalha junto ao município de São Felix do Xingu e ajudou a construir o comitê municipal do Plano ABC do município por meio de parceria com a prefeitura. O grupo obteve a garantia de que o Mapa contribuirá na elaboração do Plano ABC local. Na segunda quinzena de março, o ministério participará de um seminário na cidade.

O evento reunirá prefeitura, sindicato rural, associações de produtores, academia, extensão rural púbica e privada e outras entidades envolvidas com a produção agropecuária para debater o planejamento das ações a serem desenvolvidas, como metas de redução de emissão de gases de efeito estufa, capacitação e uso de tecnologias mitigadoras de GEE.

O comitê municipal do Plano ABC foi instituído no final do ano passado, com a edição do decreto que criou o Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas para Consolidação de uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura do Município de São Félix do Xingu.

A meta é reduzir as emissões de gases de efeito estufa em São Félix para melhorar a eficiência no uso de recursos naturais e aumentar a resiliência dos sistemas produtivos e de comunidades rurais, além de possibilitar a adaptação do setor agropecuário às mudanças climáticas.

O interesse de São Félix do Xingu em ter a versão municipal do Plano ABC – o primeiro passo foi a criação do comitê – decorre de sua forte vocação para a pecuária, segundo o coordenador de Produção Sustentável da ONG TNC, Francisco Fonseca. O gado emite gás metano, potencialmente um dos grandes responsáveis pelo aquecimento global. Com cerca de 8 milhões de hectares, o município também tinha alto índice de desmatamento, o que
começou a ser revertido a partir de 2009 depois da parceria entre o município e a ONG.

A parceria entre a prefeitura e a TNC já resultou na criação de 15 unidades demonstrativas do ABC, voltadas à pecuária, e três em áreas de cultivo de cacau. Segundo Fonseca, a proposta é fazer com que os produtores do município visitem esses locais para conhecer as tecnologias da política pública.

“Queremos sensibilizá-los para que venham a desenvolver a agricultura de baixo carbono”, reforça o coordena dor da ONG. Atualmente, São Félix tem 6 mil agropecuaristas registrados no Cadastro Ambiental Rural (CAR). Um contingente de cerca de 10 mil pequenos produtores ainda fora do CAR.

A proposta é levar aos produtores do município, por intermédio do ABC, assistência técnica, capacitação e acesso ao crédito das tecnologias sustentáveis, reforça Fonseca.

O plano nacional é estruturado em seis ações: recuperação de pastagens degradadas; integração lavoura-pecuária-floresta (iLPF), sistema plantio direto (SPD), fixação biológica de nitrogênio (FBN), florestas plantadas (FP) e tratamento de dejetos animais. As linhas de crédito para essas atividades são disponibilizadas por meio do Programa ABC – braço executivo da política pública federal.

De setembro de 2011 para cá, 26.357 produtores de todo país já aderiam a alguma das seis tecnologias do ABC, informa Elvison Ramos. Nesse período, acrescenta, foram capacitadas 31.406 pessoas (70% técnicos, 20% produtores e 10% estudantes).

O plano também contabiliza a recuperação de 3 milhões de hectares de pastagens degradadas, a integração lavoura-pecuária-floresta de 451,8 mil hectares, o plantio direto em 2,8 milhões de hectares e uma área de 1,5 milhão de florestas plantadas

Comentários