De acordo com dados da Conab, a produção brasileira de grãos mais que dobrou desde a aprovação da lei do Funrural |
A lei nº 10.256, que o STF julgou constitucional trazendo de volta a cobrança do Funrural, é de 2001. Foi apresentada na Câmara dos Deputados em 5 de maio, tramitou em regime de urgência, foi aprovada pelo Senado em junho do mesmo ano e sancionada pelo Presidente da República em julho de 2001.
A lei (re)estabeleceu a cobrança do Funrural sobre o faturamento da produção agropecuária depois que o STF julgou inconstitucional a cobrança por meio da Lei 8.212/1991. Já expliquei isso aqui no post: Entenda porque o STF mudou de posição sobre o Funrural
Na época a lei foi comemorada pelo setor rural. Em 2001 o setor rural queria pagar sobre o faturamento. Não por acaso, uma das relatorias da matéria na Câmara foi a então Deputada Katia Abreu, já presidente da Federação de produtores rurais do Tocantins.
Entendia-se, naquele momento que descontar 2,1% sobre o faturamento da safra era melhor do que desembolsar 23% todo mês (safra e entressafra) sobre a folha de salários. E de fato era. Para muitos agricultores e muitos sistemas de produção, descontar sobre o faturamento era uma solução para evitar o desembolso mensal sobre a folha.
Ocorre que o setor rural brasileiro vem passando por mudanças brutais nos últimos anos. Ha um livro da Embrapa que mostra bem essas mudanças chamado O Mundo rural no Brasil do Século 21: A formação de um novo padrão agrário e agrícola.
Para se ter uma ideia, em 2001, quando o Projeto de Lei que reinventou a cobrança do Funrural sobre o faturamento foi apresentado, os agricultores brasileiros romperam a barreira de 100 milhões de toneladas colhidas em um ano safra. Já vinhamos em uma trajetória de crescimento. Neste ano safra 2016/2017, 16 anos depois, quando o STF deu validade à cobrança, o Brasil colherá 220 milhões de toneladas. É mais que o dobro.
Em 2001, o Brasil faturou US$ 1 bi com a exportação de 543.639 toneladas de carne bovina. Em 2016, faturamos US$ 5,5 bi com a exportação de 1.400.434 toneladas. Quase três vezes mais em volume e mais de cinco vezes mais em valor.
Já naquela época, os sistemas de produção que utilizavam pouca mão de obra e produziam muito com investimentos em capital e tecnologia reclamaram da cobrança sobre o faturamento. Para eles, era melhor recolher sobre a folha de salários. Foi essa parcela do agro que deu vezo à enxurrada de ações judiciais que questionavam a Lei 10.256. Muitas liminares determinavam a substituição do pagamento sobre o faturamento pelo pagamento sobre a folha.
Nos últimos 16 anos essa parcela do agro cresceu exponencialmente, se organizou em instituições representativas e ganhou peso político. Já o grupo de produtores que se beneficia do pagamento sobre o faturamento estagnou ou encolheu.
A necessidade de ganhar escala já é um problema inerente às atividades agropecuárias. Mas, no Brasil, a disfunção da legislação trabalhista, a atuação do Ministério Público do Trabalho no campo e a ideologia de esquerda, obrigaram os sistemas de produção da agropecuária brasileira a crescer poupando mão de obra. Os produtores rurais fizeram investimentos maciços em ciência, tecnologia e capital para produzir muito usando a menor quantidade de empregados possível.
A evolução do agro brazuca, a invenção do #AgroTrópico, transformou a cobrança de Funrural sobre o faturamento muito mais onerosa do que o recolhimento sobre a folha de salários. Em parte, na opinião deste humilde escriba, essas mudanças explicam a revolta do setor rural contra a decisão do STF.
O Brasil rural mudou muito nas últimas 4 ou 5 décadas. Nos anos 60, nós ainda importávamos parte significativa dos alimentos que consumíamos. Hoje, o #AgroTrópico é um maiores exportadores de grãos e carnes do mundo.
Aqui e acolá, vez por outra, esse novo agro fará uma pisadura em alguém. Algumas vezes, como agora nesse caso do Funrural, a pisadura é no nosso próprio lombo.
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