Assim é que se faz

Do alto de uma torre de monitoramento dos ventos, a 15 metros de altura, em sua fazenda na periferia do Território da Capital Australiana, Peter Spencer consegue atingir o primeiro-ministro do país e sua campanha de ½ ambiente.

Peter Spencer (a esquerda) em sua propriedade com o professor de direito Erryl Higgins.

"Quero que o país saiba que enquanto Kevin Rudd (primeiro ministro autraliano) gaba-se no cenário mundial, vociferando como ele cumpre os compromissos ambientais, ele vem roubando dos agricultores australianos", disse o criador de ovelhas, de 61 anos, ao "Financial Times", enquanto o barulho do vento estalava na linha telefônica.

Spencer está em sua oitava semana de greve de fome, em protesto pelas restrições governamentais ào uso agrícola de propriedades privadas, sem direito a compensações. Com cerca de 10% de sua propriedade em uso, o produtor, com seis filhos, vem combatendo as autoridades federais e estaduais há cerca de dez anos pelo direito de usar mais 30% de seus 8 mil hectares de terras para criar ovelhas.

Spencer argumenta que a proibição ao uso agrícola viola seus direitos constitucionais, porque o governo tornou sua propriedade comercialmente inviável. Ele diz que outros agricultores desesperados vêm sendo levados ao suicídio e que escreveu a Rudd pedindo por uma Comissão Real, como são chamadas na Austrália audiências públicas que avaliam decisões governamentais, para examinar a questão e por indenizações justas para os agricultores.

A legislação australiana, que afeta 109 milhões de hectares de propriedades privadas, permitiu ao maior país emissor de carbono no mundo desenvolvido cumprir suas metas de combate às mudanças climáticas, apesar dos fortes aumentos nas emissões dos setores industrial e energético. Também possibilitou que o país anulasse 87,5 milhões de toneladas de carbono.

Charles Armstrong, presidente da Associação de Agricultores de Nova Gales do Sul, afirmou que a capacidade mostrada pela Austrália para cumprir suas metas do protocolo de Kyoto é um "exercício de ilusão de espelhos". Disse ainda que o veto poderia ameaçar o abastecimento de alimentos da Austrália, o meio de vida dos fazendeiros e o setor agrícola como um todo, que contribui com 32 bilhões de dólares australianos (US$ 29 bilhões) em exportações anuais.

A campanha de Spencer ganhou atenção nacional, mas trouxe um custo considerável para sua saúde. Ele sobrevive de água, suco de limão, vitaminas e analgésicos. Diz ter perdido cerca de 35 quilos, mais de 25% de seu peso, mas mostra poucos sinais de que desistirá antes de Rudd atender suas queixas. "Não sei dizer até quando poderei chegar", diz Spencer. "Se você vai tomar uma propriedade, tem que pagar por isso. O primeiro-ministro está fora da constituição e eles importunam uma minoria que está indefesa", acrescenta.

Mais de 30 mil fazendas, cerca de 22% do total nacional, são afetados pela proibição de desmatamento. A campanha de Spencer ganhou pouco apoio do governo trabalhista ou da oposição, que introduziu parte das restrições quando estava no comando. As autoridades fizeram poucos comentários, limitando-se a dizer que a queixa está na Suprema Corte, que deverá levar vários meses para julgá-la.

Nesta semana, o líder do partido Nacional no Senado, de oposição, Barnaby Joyce, apoiou Spencer em manifestação em Canberra, que atraiu centenas de agricultores. "Literalmente, as pessoas acordaram certo dia e os bens que possuíam no dia anterior não eram mais delas", disse Joyce. "Sim, eles têm de pagar os impostos, eles têm de pagar o seguro público, mas não podem usar suas fazendas. O governo tornou-se ladrão de um bem e quando isso acontece há uma palavra que define a situação. Essa palavra é comunismo", afirmou Joyce.

Os que estão do lado de Spencer dizem que o governo poderia ter de pagar mais de 60 bilhões de dólares australianos se tivesse de compensar os fazendeiros, pagando indenizações, contas públicas e impostos sobre a terra. Por ora, familiares e amigos de Spencer insistem para que ele acabe com sua greve de fome. Seus quatro filhos adultos, todos residentes nos Estados Unidos, voltaram à Austrália, preocupados com sua saúde.

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Em tempo, esse texto saiu no Financial Times e foi reproduzido no Valor Econômico. A Austrália tem um mecanismo semelhante à nossa reserva letal.

No Brasil não há em um único produtor com os cojones que tem Spencer. Se tivéssemos muitos Spencers os direitos dos produtores seriam observados.

Saiba mais: Court Declares Farmers Have “Arguable Case” for Compensation



Conheça um grupo de debates na internet criado por Alastair McRoberts para suporte da luta de Peter Spencer http://agmates.ning.com/group/peterspencerhungerstrike

Comentários

Luiz Prado disse…
A Austrália, como o Brasil, sempre foi uma farsa em termos de políticas relativas ao meio ambiente em geral e, em particular, à biodiversidade e às mudanças climáticas. Essa noção desses ambientalistas do 7o. dia, metidos a salvadores do mundo, de que é possível produzir comida para toda a humanidade ampliando a área florestada é uma farsa. E não é apenas uma farsa burra, porque por trás dela há os interesses eleitoreiros de quem manipula a ingenuidade dos eleitores urbanos. Essas bobagens não acontecem nos países que efetivamente buscam a sua segurança energética e alimentar,c om redução das emissões através de avanços tecnológicos.