Pseudociência ½ ambiental

Veja como se constrói um sofisma. Quando o ex ministro da agricultura Reinhold Stephanes iniciou suas críticas ao código florestal um dos argumentos utilizados era o de que a não inclusão das APPs no cômputo das RLs levaria ao arranquio da milhares de pés de maçã e café historicamente plantados em encostas no sul e sudeste do país.

O WWF então contratou e pagou um estudo que mostrasse o contrário. Esqueçamos por um instante que a pré determinação da conclusão já destrói a ciência do trabalho e analisemos o resultado. Você pode fazer o download de uma apresentação do estudo clicando aqui. Veja você mesmo. O estudo tenta mostrar que uma percentagem muito pequena dos cultivos existentes é perdido por causa das APPs.

Perceba o(s) truque(s). Truque número um: Repare que a análise foi feita usando a área do município como base de cálculo das percentagens de APP. O Código Florestal não se aplica aos municípios. O Código Florestal se aplica às propriedades privadas existentes nos municípios. Análises quantitativas que não consideram as áreas privadas simplesmente não significam nada em termos científicos, podem estar completamente erradas. Não é possível saber se as APPs, cuja recuperação é necessária, estão dentro ou fora dos imóveis e também não é possível saber qual o peso relativo dessas APPs na área total dos imóveis. O trabalho não tem condições de afirma que o argumento do ex ministro Stephanes está errado.

Truque número dois: Repare nas tabelas de resultado (slides 8, 15, 20 e 24) que o trabalho apenas considera as APPs mapeadas no que eles chamam de "lavouras". As APPs mapeadas em "outros usos", que ocupam a maior parte em todos os municípios avaliados, não foram consideradas. Isso subestima o resultado final.

Truque número três: Talvez seja o mais sutil e significativo. O trabalho usou para a delimitação das APPs um modelo digital de elevação de terreno chamado ASTER GDEM. Aster é o nome do sensor remoto que gerou o dado, GDEM é a abreviação de Global Digital Elevation Model. Global é a palavra. O modelo númerico de terreno é adequado para análises em escalas pequenas (globais) e apresenta erros quando utilizado em escalas grandes em nível municipal ou de propriedade. O modelo simplesmente não enxerga alguns declives em escalas grandes e subestima a a quantidade de APP quando utilizado em escalas locais.

Esse trabalho foi usado para fazer a cabeça dos jornalistas no workshop promovido pelo WWF-Greenpeace-SOSMA. Eu já vi gente boa citar esse trabalho para desqualificar o argumento do Stephanes. É bem provável que também os jornalistas tenham levado para casa suas conclusões como verdades científicas apesar de não passarem de sofismas.

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